O JornalDentistry em 2016-3-13

CONVIDADOS

A Periodontite de Van Gogh

Vincent Van Gogh é reconhecido como um dos artistas mais importantes de toda a história da humanidade.

Réplica de “Skull of a Skeleton with Burning Cigarette”

As centenas de desenhos, pinturas e cartas que deixou em pouco mais de uma década de trabalho (1880-1890) permitiram recriar a sua história de vida e causar um enorme impacto cultural nas gerações que lhe seguiram.

Na verdade, Van Gogh apenas recebeu o “chamamento” para se tornar pintor aos 27 anos de idade, após ter trabalhado para a empresa Goupil como negociador de arte durante quase seis anos. Contudo, os primeiros tempos não lhe correram de feição e os seus trabalhos foram muito criticados, como é o caso da famosa pintura The Potato Eaters. Foi por causa de um colega lhe ter referido que essa obra não se tratava de um quadro, mas sim
de uma caricatura, em que uma das mulheres surgia com o nariz em forma de dado, que Van Gogh decidiu reposicionar-se e repensar a sua forma de se apresentar como artista.
Decidiu então estudar e treinar mais, encontrando nos auto retratos a forma ideal para trabalhar metodicamente, experimentar diferentes maneiras de empregar as cores e evitar ter de remunerar os modelos pois o dinheiro não abundava. Só em Paris, onde viveu com o seu irmão Theo, são-lhe conhecidos 28 autorretratos no espaço temporal de dois anos. Existe, porém, um conhecido esboço anterior ao período na capital francesa que me deixou surpreendido quando, numa visita recente a Amesterdão, ouvi o guia do Van Gogh Museum referir que pode ser interpretado também como um autorretrato do génio holandês.
Em Antuérpia, enquanto se encontrava matriculado na escola de artes, Van Gogh criou Head of a skeleton with a burning cigarette (1886). Por um lado, a descrição refere que uma parte do treino tradicional de arte envolvia o estudo da anatomia dos esqueletos e que, portanto, o cigarro aceso poderia ser apenas uma piada típica de um estudante a satirizar as aulas que
frequentava. Mas por outro, existe uma carta dessa mesma data que não fica indiferente ao contexto desta tela. Nas palavras do próprio, um simples diagnóstico de periodontite: “(...) eu piorei a minha saúde ao fumar tanto. Comecei a preocupar-me quando os meus dentes começaram a cair um a seguir ao outro. A minha boca estava geralmente dolorida, eu apenas engolia a comida o mais rápido possível (...)”.
De facto, uma investigação mais aprofundada às suas cartas demonstra que os “maus dentes” sempre tiveram um papel importante na vida de Van Gogh. Não só existem extensas descrições de “dores de dentes que se estendiam para os olhos, ouvidos e cabeça e que não permitiam que se concentrasse no seu trabalho” como, mais tarde, uma referência a uma “enorme operação em que extraiu os dentes que ainda restavam” e substitui-os por duas próteses “que melhoraram em muito a sua aparência”.
Desde a sua morte com um tiro em 1890 que a vida de Van Gogh se tornou num tema de irresistível interesse para historiadores de arte, biógrafos, jornalistas, cineastas, psiquiatrias e outras profissões. Pelos vistos, também para médicos dentistas.

 

Texto Fernando Arroba MD, Ilustração: Diogo Costa | dcosta_4@msn.com

 

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OJD 123 DEZEMBRO 2024

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