JornalDentistry em 2023-12-20

CONVIDADOS

Os desafios da implantologia contemporânea e o papel da Sociedade Portuguesa de Implantologia e Osteointegração (SOPIO)

A Implantologia representa uma das áreas com maior projeção científica e tecnológica em Medicina Dentária.

Prof. Doutor João Caramês

O sinergismo estabelecido entre indústria e investigação, consubstanciado pelo crescente número de implantes colocados anualmente em todo o mundo, estimando-se em mais de 2,5 milhões, assume simultaneamente um caráter promissor, mas também de desafio para todos os que exercem esta área1.                   
 
Deve reconhecer-se primeiramente que os desafios da Implantologia incidem não apenas nos futuros candidatos a reabilitação oral com implantes, mas também nos milhões de pacientes portadores de implantes que ao longo da sua vida poderão apresentar algum tipo de complicação biológica ou prostodôntica. Numa avaliação sistemática de estudos clínicos com follow-up de 10 ou mais anos, reconhece-se que a taxa de sobrevivência de implantes é significativamente alta de 94,6%, apontando a conhecida alta previsibi- lidade desta opçãode tratamento2. Contudo, o outcome de sobrevivência é escasso para traduzir a sua efetividade na população em geral3.

Quando avaliada, observa-se a prevalência de peri-implantite até um valor de 47% e uma correlação positiva entre a sua ocorrência e o tempo de vida do implante4.          

Em função do tipo de reabilitação e do material utilizado, diferentes níveis de complicações prostodônticas são também registadas5.
Com exceção de certos contextos regionais, desconhecemos a frequência de complicações com implantes na população. A ausência de questionários/observações de saúde oral nacionais centralizados (NOHS – National Oral Health Surveys) é uma constatação frequente em vários países, entre os quais Portugal6.

A sua implementação ajudaria a compreender melhor a realidade que nos rodeia bem como importante contributo para o esclarecimento e literacia dos pacientes.
Enquanto doença inflamatória com repercussão sistémica, a peri-implantite é um fator de risco funcional e estético do implante cujo diagnóstico precoce e tratamento preciso são ainda difíceis de estabelecer. Continuamos sem conseguir dar uma resposta efetiva à resolução da doença peri-implantar quando esta se instala em fases mais avançadas. O seu controlo é um desafio que se expressa na investigação e proposta de novas superfícies implantares com propriedades antibacterianas, ou em novos meios e protocolos de tratamento cirúrgico e não cirúrgico.
Deve ser salientado que a observação desta e de outras complicações é muitas vezes secundária a um planeamento menos correto ou à execução menos apropriada da técnica cirúrgica ou reabilitação.
O rápido desenvolvimento da era digital, em crescente generalização, veio prestar um importante contributo para o melhor planeamento e conhecimento dos casos clínicos. O seu domínio pleno é um desafio para todos. Potenciar a tecnologia disponível com o nosso conhecimento clínico parece ser a fórmula para proporcionar ao paciente uma maior pre-visibilidade no tratamento prestado.
Na fase de planeamento da reabilitação destacaria o maior grau de precisão, rapidez e flexibilidade das ferramentas de “smile design” ou de simulação da reabilitação final. Poder conceber virtualmente com elevado grau de realismo o desenho da prótese a colocar num desdentado parcial ou total a partir de imagens adquiridas por um scanner intraoral de alta resolução, scanner facial e simultaneamente intersectá-la (através de algoritmos precisos de sobreposição de imagem) com imagens 3D ósseas obtidas por CBCT (abreviatura para cone beam computed tomography) da zona edêntula representam um avanço tornado hoje realidade.  Se considerarmos, que prosseguindo este fluxo de trabalho é possível obter uma guia cirúrgica, produzida através de uma impressora 3D, que assiste a colocação do implante de forma mais precisa, esta é uma enorme mais-valia.
Nem todos os casos candidatos a implantes carecem de cirurgia guiada, mas todos devem reconhecer um planeamento digital guiado ao melhor estudo do caso clínico, e se possível a uma menor invasividade da abordagem cirúrgica que garanta o conforto do paciente.
Também na área cirúrgica destacaria como desafio a validação clínica a longo prazo de implantes curtos (≤ 6mm), ou o recurso a abordagens regeneradoras “tailor made”, como, por exemplo, malhas de titânio padronizadas para procedimentos complexos, procurando menores complicações pós-operatórias. Ambas poderão ser soluções possíveis na maxila, mas, sobretudo, na mandíbula posterior mediante correto planeamento centrado no paciente.
Em matéria de substitutos ósseos em regeneração, perspetiva-se a maior utilização de biomateriais sintéticos, concebendo-se um “scaffold” de regeneração composto, não simplesmente formado por um tipo de material. Tomando a abordagem digital e centrada no paciente para a regeneração óssea guiada em aumentos horizontais e verticais extensos, a produção de scaffolds individualizados ao defeito trará também previsibilidade a estes procedimentos.
A nível da prostodontia sobre implantes, o grande desenvolvimento tecnológico e a concorrência entre scanners intraorais de alta resolução vieram tornar possível um fluxo de trabalho exclusivamente digital preciso e reprodutível a nível da reabilitação unitária e parcial. No futuro, face ao seu desenvolvimento ou em associação a scanners extra-orais, o fluxo exclusivamente digital em reabilitação total será também uma realidade.
Se esta descrição enaltece todo o potencial da era tecnológica, deve salientar-se que a sua aplicação apenas fará sentido se o fluxo de trabalho gerado tiver subjacente o conhecimento e a formação científica do médico. Agir com ferramentas digitais impõe o desafio de um pensamento biológico que compreende as várias estruturas que compõem a cavidade oral e a individualidade subjacente a cada paciente.
Para implementar as práticas mais atuais em Implantologia é necessário aderir a formação e treino contínuo ao longo da vida. Tal como sublinhado pela Associação Euro- peia de Osteointegração (EAO), e de acordo com a opinião de 138 experts, o papel das sociedades científicas na educação adquire um relevo primordial7.
Em Portugal, o desenvolvimento e promoção da Implantologia Oral nos últimos anos tem reconhecido um contributo importante da Sociedade Portuguesa de Implantologia e Osteointegração. (SOPIO) A este respeito, devemos enaltecer o trabalho realizado pela Direção cessante, em particular o papel tido pelo seu Presidente o colega Dr. Nuno Cruz.                                                                                                         A SOPIO tem tido um papel relevante, não apenas pela realização anual do seu congresso, mas também pela organização de diferentes cursos de formação contínua ou o acesso dos seus associados a publicações científicas de referência na área.
Devemos reconhecer que os princípios e padrões subjacentes à prática de uma correta Implantologia Oral foram objetivos essenciais alcançados pela SOPIO desde a sua criação.
Numa área tão desafiante e com diferentes níveis de complexidade, acredito que só poderemos ser competitivos se progredirmos cientes das nossas reais capacidades e apostando em formação. A equipa que compõe a SOPIO é uma equipa cientificamente muito capaz e com elevado sentido de organização. É sob esta condição e honrado espírito de liderança e equipa que decidi abraçar o desafio de presidir a SOPIO neste mandato.
Definimos como objetivos para os próximos anos entre outros: o regresso a eventos formativos presenciais, como a 6ª edição do congresso e o estabelecimento de sinergismos com sociedades científicas congéneres europeias, que permitirão uma importante partilha e intercâmbio entre colegas e associados e uma divulgação internacional da nossa sociedade.
Contando com todos os que se queiram juntar à SOPIO empregaremos o necessário dinamismo científico para um alargado espaço de formação e debate sobre os temas mais atuais e relevantes temas em Implantologia. Esta perspetiva irá enriquecer todos os seus associados e participantes, confirmando a SOPIO como sociedade científica de referência em Implantologia no espaço europeu.

 

 

Referências Bibilográficas:
Pedido de referências bibliográficas para herminia.guimaraes@jornaldentistry.pt

 

 

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