O JornalDentistry em 2017-5-30
Há duas ou mais décadas, referir um assunto que implicasse a cura do corpo através da mente poderia ser demasiado ilusório ou polémico.
Contudo, nos dias de hoje, com a existência de alguns relatos de remissões espontâneas
ou processos de auto cura, poucas dúvidas permanecem sobre as provas que têm sido estabelecidas sobre uma forte conexão entre mente e corpo, sendo a mais conhecida designada por “efeito placebo”.
Em linguagem farmacológica, a palavra “placebo” tem o significado de “toda e qualquer substância sem propriedades farmacológicas, administrada a pes- soas ou grupo de pessoas como se tivesse propriedades terapêuticas” e, na sua etimologia, deriva de placere em latim, que significa “agradar”. O grande
problema relacionado com o efeito placebo (e importa referir que alguns medicamentos prescritos podem tam- bém partilhar esta imprevisibilidade) é a componente ética de um eventual “logro”. No fundo, o clínico não quer cometer o ato de iludir o seu doente, pois nenhum profissional com ética nega o melhor cuidado descrito pela literatura científica atual.
É certo que a melhor cura e evicção de recidivas é a prevenção. Não há como contornar que a chave para a cura é sempre um estilo de vida que otimize o que o corpo pretende, isto é, prática de exercício físico saudável e moderado, peso e nutrição equilibrados, stress reduzido e atenção a questões psicológicas, sono adequado e evitar substâncias tóxicas como álcool, drogas e nicotina. Só que existe ainda um item com extenso terreno por explorar, extremamente poderoso e no qual a neurociência continua a ter avanços extraordinários, que é este fortalecimento da conexão entre mente e corpo. E que maior agrado (placere) pode o corpo dar à mente, ou vice-versa, do que o sorriso? Não existe melhor forma de o cérebro inconsciente manifestar a sua felicidade como acontece aquando de um sorriso incontrolado e sem explicação (relação mente-corpo). Pergunto então: por que não tentar o oposto? Treinar o corpo para o sorriso consciente para que o cérebro sinta essa felicidade (relação corpo-mente). E existe uma forma simples de o tentar: fazer uma lista de cem palavras consecutivas com a letra i, o vocábulo que mais tonifica os músculos da mímica facial responsáveis pelo sorriso. Como passatempo, expe- rimentei e resultou comigo, pois tive a sensação de me encontrar mais bem-disposto e feliz depois do exercício,
o que não acontece quando estou com a cabeça inclinada, os ombros fechados e o dedo indicador viciado na social media do telemóvel. Vou continuar a treinar este efeito placebiiii e observar os resultados a longo prazo no meu feitio... Coisas de que me lembro de fazer quando estou na sala de espera da minha ida regular ao dentista.
Texto: Fernando Arrobas, médico dentista — fernando.arrobas@jornaldentistry.pt
Ilustração: Diogo Costa — dcosta_4@msn.com