O JornalDentistry em 2016-6-16
Quando, em 1965, o cirurgião ortopédico Per Brånemark colocou o primeiro implante dentário de titânio num voluntário humano sueco de nome Gösta Larrson, ainda pouco se sabia sobre a forma como a história da prótese dentária se alteraria profundamente.
Hoje, cinquenta e um anos depois, pode afirmar-se que existem centenas de empresas a comercializar este dispositivo médico, o qual é colocado diariamente na cavidade oral de milhares de pessoas no mundo inteiro.
A cavidade oral é parte integrante do sistema digestivo e respiratório, apresentando três funções principais e três acessórias. São elas a mastigação, a fonação, a estética, a sexualidade, a respiração e a execução de certas atividades como por exemplo tocar um instrumento musical. A verdade é que, em toda a história milenar percorrida pela medicina dentária, não se conhece ponto de maior desenvolvimento em relação à recuperação destas funções (quando perdidas) como os dias que se vivem atualmente. Os implantes dentários e a reabilitação oral trouxeram consigo uma nova era, que permitiu a oferta de tratamentos avançados capazes de deixar de lado as válidas soluções anteriores, tais como as próteses removíveis, e recuperar a qualidade de vida dos pacientes sob um ponto de vista funcional, psicológico e de integração social.
Ao longo dos anos, são imensos os relatos de casos clínicos e testemunhos de diversas pessoas que se sujeitaram a este tipo de tratamentos de forma a recuperar os dentes perdidos ou de prognóstico reservado, trazendo acopladas a essa intervenção melhorias significativas noutros campos da sua vida pessoal e profissional. Renovação da autoestima, combate à depressão, confiança na procura de trabalho, eliminação do hábito de colocar a mão à frente dos lábios antes de falar com alguém e sentimento de prazer ao triturar e saborear os alimentos são alguns dos exemplos mais comuns.
E é mesmo a propósito deste último que pretendo relatar uma curiosidade com que me deparei ao ler um livro recentemente, que em muito contribui para aprofundar a relação holística evidente entre saúde oral e saúde mental.
O tema de ‘Mindfulness’, ou em português ‘Atenção plena’, tem empolgado o mundo. Os resultados desta Terapia Cognitiva, desenvolvida por Mark Williams, Professor de Psicologia Clínica da Universidade de Oxford, têm sido de tal eficácia que o Serviço Nacional de Saúde Britânico já a recomenda como a primeira terapia no combate à depressão naquele país, pois os estudos demonstram que os efeitos clínicos são semelhantes à terapêutica antidepressiva farmacológica, mas sem os devidos efeitos secundários. E trata-se de algo tão simples como um plano de meditação, respiração e relaxamento de oito semanas sem quaisquer tipo de custos relevantes associados.
De acordo com o terapeuta britânico, a primeira semana de ‘felicidade’ começa a ganhar raízes com a ‘Meditação do Chocolate’. O exercício passa por dedicar cerca de dez minutos de atenção plena ao ato de comer um quadrado de chocolate, ao invés do movimento brusco de o engolir de uma assentada. Iniciar pelo toque, sentir o cheiro, de seguida olhar para ele e, lentamente, saboreá-lo enquanto se fazem movimentos com a língua contra as rugas palatinas deixando-o derreter. Segundo a explicação que deu, aquando da apresentação do seu livro em Portugal na Fundação Champalimaud, é nesse instante que a mente começa a vaguear e, quando regressam ao momento presente, raras são as pessoas que não admitem que ao fazê-lo desta forma saborearam o chocolate como nunca haviam feito, identificando outros sabores diferentes anteriormente desconhecidos. O objetivo do programa de Mark Williams é que, após esta primeira experiência, se aplique um caminho semelhante de mudança e atenção plena sobre outros hábitos de vida das pessoas...
Ao ter lido este livro, percebi que não só a substituição das próteses removíveis com cobertura total do palato por próteses sobre implantes é um passo fundamental para que muitas pessoas possam realizar a sua ‘Meditação do Chocolate’, como também cabe aos médicos dentistas o papel de ensinar aos seus pacientes a saborear melhor os alimentos, tal como o faz em relação à higiene e outros hábitos para funcionais. Não apenas se podem evitar danos sobre as próteses decorrentes de padrões de mastigação sem os devidos ciclos de trituração necessários, mas também se contribui para a saúde mental e bem-estar dos pacientes com elevada evidência científica. De ora em diante, fica a sugestão de que a famosa maçã a ser trincada pelos ‘novos’ dentes comece a ser substituída por uma barra de chocolate negro (sem açúcar) prestes a ser saboreada, de forma lenta e com a máxima atenção plena que puder ser dispensada naquele momento presente.
Texto: Fernando Arrobas, médico dentista
fernando.arrobas@jornaldentistry.pt
Ilustração: Diogo Costa
dcosta_4@msn.com