O médico dentista é o profissional de saúde responsável pelo estudo, diagnóstico, prevenção e tratamento das doenças da cavidade oral e estruturas adjacentes.
No seu espetro de ação incluem-se os dentes, as gengivas, os maxilares, os músculos mastigatórios e da cabeça e pescoço, os lábios, a língua, as glândulas salivares e a articulação têmporo-mandibular.
Acresce que as novas perspetivas holísticas em medicina obrigam o profissional a ter conhecimento de outras doenças com origem em outros
sistemas que podem ser relevantes para a sua prática clínica ou mesmo, ao intervir como prestador de cuidados de saúde primários, saber detetar e encaminhar para o especialista adequado. É por isso que observo com apreço a integração da medicina dentária em unidades de saúde com mais serviços ou, por outro lado também, as ramificações e parcerias que se encontram cada vez mais em clínicas dentárias, como sejam os casos da fisioterapia, psicoterapia ou nutrição.
De facto, faz todo o sentido que nutrição e medicina dentária andem de mãos dadas. Realizar tratamentos de cáries, ou mesmo trabalhos extensos de reabilitação oral, sem uma alteração dos padrões dietéticos para níveis mais adequados é provavelmente não resolver o problema a montante.
Chega este tema a propósito de uma desordem alimentar rara, pouco conhecida e sub diagnosticada. Normalmente associada a deficiências nutricionais de ferro, falta de vitaminas e problemas psiquiátricos, em particular em mulheres grávidas e em crianças com dificuldades de desenvolvimento, a síndrome de Pica ou alotriofagia é uma afeção em que se gera apetite e consumo regular (durante pelo menos um mês consecutivo) de coisas ou substâncias não alimentares como sejam terra, moedas, carvão, metal, tecidos, sabão, etc. Num caso particularmente bizarro e espalhado pela internet, foram removidas vinte escovas de dentes do estômago de um doente que chegou ao hospital com dores abdominais muito intensas. Outros casos mais simples começam com a vontade recorrente de trincar e comer gelo (pagofagia), algo a que já todos assistimos ou ouvimos relatos.
De entre as várias especialidades na área da saúde, a medicina dentária é uma das mais procuradas e com maior volume anual de consultas, tornando-se assim um espaço de primeira linha na prevenção e diagnóstico precoce, mesmo de doenças que não cabe diretamente ao seu foro tratar. Procurar e desenvolver formações específicas e, por conseguinte, adquirir conhecimentos básicos em áreas de fronteira como sejam, entre outras, a psicoterapia e a nutrição penso que é algo que pode trazer novas luzes a este oceano atual que exige cada vez mais diferenciação e qualidade. Nas palavras de William Osler, considerado o pai da medicina moderna, “tão importante quanto conhecer a doença que o homem tem, é conhecer o homem que tem a doença” e, como tal, “na verdade, não existem especialidades na medicina, porque, de forma a saber as doenças mais importantes, o homem deve estar familiarizado com as manifestações nos vários órgãos”. Tanto os dentes e a cavidade oral são importantes para diagnosticar outras condições, como o contrário deve ser igualmente válido. Ser dentista ou médico dentista? Eis a questão.
Autor: Fernando Arrobas, médico dentista,
fernando.arrobas@jornaldentistry.pt